O blogue de José Pacheco Pereira tem um nome extremamente feliz:
Abrupto. Este meio de comunicação é assim: abrupto. Escreve-se directamente para uma máquina infernal que, em segundos, nos coloca a mensagem à mercê de uma comunidade. Pessoalmente, a máquina ainda me assusta. Não sou abrupta. Gosto de ler e remoer o que escrevo (mesmo os divertimentos) e esta brusquidão do meio ainda me perturba um tanto.
Mas Pacheco Pereira é - e sempre foi - abrupto. Uma vez que há anos e anos diz exactamente as mesmas coisas, a sua relação com este meio de comunicação está enormemente facilitada. Estas suas últimas reflexões sobre a imprensa são, mais coisa menos coisa, as que o iluminaram durante o cavaquismo, no seu auge e decadência.
Na conjuntura, a questão ideológica é o Iraque. As discussões sobre a imprensa, quer feitas em público, quer feitas no café, costumam estar contaminadas por uma análise de algumas parcelas que cada um manobra a seu bel-prazer, retirando as conclusões conformes à sua ideia pré-concebida. O expoente máximo disto será Alberto João Jardim (que denuncia conspirações por todo o lado), mas nenhum de nós escapará por vezes aos confortáveis lugares comuns. O dogmatismo endémico de Pacheco Pereira leva-o a funcionar há anos - no seu discurso sobre a imprensa - abruptamente e nada do que escreveu nos seus 'posts' recentes nos pode surpreender.
Pacheco Pereira sabe que não é verdade que os editoriais do Diário de Notícias só "às vezes" fossem pró-coligação. Quando falavam do PS ou do défice, "às vezes", não seriam pró-coligação. Qualquer um dos directores do DN o admitirá sem esforço. Pacheco Pereira sabe que é verdade que a orientação editorial da secção internacional do Diário de Notícias não era inspirada pelos textos de Robert Fisk. Mas reconhecer isso abalava a teoria que há anos Pacheco Pereira sustenta e que, de certa maneira, o consagrou como alegado teórico dos média.
O sofá da nossa consagração é o mais confortável de todos. Pacheco Pereira aí se mantém, rodeado de uma legião de discípulos embasbacados pelo seu enorme conhecimento, a sua às vezes desconcertante sensibilidade e, talvez em primeiro lugar, a sua inebriante sedução.