O tema é arriscado, bem sei. Mas não me importo. Já me senti de luto por pessoas queridas que me morreram. Sentir de luto quer dizer sentir-me muito, muito triste – e durante muito tempo. Quer dizer que um bocado do meu quotidiano (que estava associado a essa pessoa) deixou de fazer sentido – deixou de existir, ficou vazio. Quer dizer que, depois da morte da pessoa querida, não só se cria esse vazio como não se sabe como voltar a preenchê-lo – e às vezes nem se deseja preenchê-lo, por recusa de aceitação da morte. E isto quer a morte tenha surpreendido ou não.
Foi assim que eu me senti de luto, quando isso aconteceu. E portanto não me custa afirmar que eu
não me sinto de luto pela morte de Sérgio Vieira de Mello; nem me sinto de luto (nem nunca senti) pela morte violenta de milhares de pessoas, no Médio Oriente ou em qualquer outra parte do mundo.
Serei um monstro por dizer (e, sobretudo, sentir) isto? Cada um que julgue como quiser, se quiser. O que queria dizer é que recuso lutos social, cultural e politicamente sugeridos, como aquele que li numa frase do
Outro,Eu onde CVM, para explicar “
a réstia de sentido de luto” que o "
impediu de entrar na polémica (…) sobre as causas políticas dos atentados em Jerusalém e Bagdad”, afirmava:
“
Há coisas que é escandaloso discutir com os corpos das vítimas ainda quentes.”
Cada um sente o luto como sente e por quem sente. Admito perfeitamente que CVM o sinta pelas vítimas desses atentados. Mas considero inaceitáveis juízos moralistas que implicitamente me acusam (a mim e a muitos outros) de ser “
escandalosos” ao discutir os referidos os atentados “
com os corpos das vítimas ainda quentes”. É certo que CVM admitia logo a seguir, se bem entendi, que sobre o Médio Oriente não há tempo para não-debater – os atentados sucedem-se uns aos outros e se o “
sentido de luto” implicasse automaticamente o silêncio, seria impossível falar.
Mas, seja como for, a frase que me irritou revela um inegável ímpeto populista, isto é, arrisca-se a fazer caminho. Suscitam, aliás, uma imediata pergunta: quem determina quando é que o debate se pode fazer? Ou seja, e com toda a brutalidade: quem vai tirar a temperatura aos cadáveres para depois autorizar (ou não) o debate?
Aqui, a milhares de quilómetros, a racionalidade é possível. E lá, no Médio Oriente, também, mesmo no meio do maior horror. À morte não se pode seguir o silêncio, nem lá nem aqui. É o outro nome da morte.
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20170407