Glória Fácil...

...para Ana Sá Lopes (asl), Nuno Simas (ns) e João Pedro Henriques (JPH). Sobre tudo.[Correio para gfacil@gmail.com]

terça-feira, maio 4

A boçalidade está de volta…

…à blogosfera, pela pena de Vasco Rato, que na TV até parece uma pessoa muito civilizada.

O conhecido pensador acha que os barnabés “sucumbem à lógica do quanto pior melhor"; que “rejubilam” com a morte de soldados norte-americanos; que “deitam foguetes” quando morrem civis iraquianos; e que, no fundo, “choram lágrimas de crocodilo” pelas vítimas da guerra “porque o mais importante é marcar pontos políticos”. Eu julgava, na minha infinita ingenuidade, que esta boçalidade argumentativa já estava em decadência na blogosfera. Enganei-me, claro.

A boçalidade caracteriza-se por recorrer sistematicamente a processos de intenção. Parte sempre do mesmo “axioma”: quem é contra a guerra é pelo terrorismo (em geral) e pelo Saddam (em particular). A partir daí, vale tudo: quem diz que as coisas estão a correr mal no Iraque “rejubila” com isso, “deita foguetes”, “chora lágrimas de crocodilo” pelas vítimas, vive, enfim, na “lógica do quanto pior melhor”.

É escusado explicar-lhes que ser contra esta guerra não implica ser pelo terrorismo (nem sequer implica ser pacifista, o que eu não sou). É escusado explicar-lhes porque receiam que só o acto de ouvir signifique ceder. Isto é, reconhecer pelo menos alguma razão a quem se opôs à guerra.

Ora isso é-lhes inadmissível. A guerra pode estar a ser perdida no terreno (ganha não está, de certeza); mas de modo algum pode ser perdida no espaço público. Encaram isso como o princípio do fim. Por outras palavras: o debate não é encarado como debate, é só mais um campo de batalha. A boçalidade argumentativa permite ainda aos seus autores manterem uma razoável dose de alheamento face a uma realidade no terreno que lhes é profundamente desconfortável porque, entre outros factores, sabem ser bastante responsáveis por ela.

É também própria de pensadores profundamente sectários ou mesmo totalitários. Foi desta massa que se moldaram em Portugal “verdades” do género “Tudo pela Nação, nada contra a Nação”. Também foi desta massa que se moldaram os argumentários que permitiram ao PCP andar décadas e décadas a afastar das suas fileiras todos os que tinham dúvidas sobre os “amanhãs que cantam” do outro lado do Muro. Qualquer sinal de diferença é imediatamente diabolizado. Com a diferença não se cohabita; a diferença elimina-se, expulsa-se, apaga-se, seja por que meio for – porque aqui os fins justificam os meios.

Há uma verdade incontornável: foram argumentários boçais deste genéro que criaram o caldo de cultura onde se forjou a actual situação no Iraque. A culpa não é, certamente, de Vasco Rato. Mas é certamente dos vascos ratos norte-americanos que constituem a “entourage” intelectual do sr. Bush. E que inspiram o nosso pensador.

PS – Já sei que alguém há-de dizer que este texto é uma “encomenda” do Barnabé, etc, etc, etc. Também esse argumento caracteriza a tal boçalidade.
|| JPH, 17:25

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