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...para Ana Sá Lopes (asl), Nuno Simas (ns) e João Pedro Henriques (JPH). Sobre tudo.[Correio para gfacil@gmail.com]

sexta-feira, junho 25

Os jornalistas da selecção (III)

Um dia destes – depois do jogo com a Rússia, antes do jogo com a Espanha – a “esmagadora maioria” (TSF dixit) dos jornalistas portugueses que acompanham a selecção decidiu autografar uma camisola da equipa e oferecê-la a Scolari. Um gesto (televisionado, fotografado, em suma, noticiado, portanto público) que o próprio muito apreciou, evidentemente.

Discordei e discordo. A minha opinião é certamente, irrelevante – e, por isso mesmo, não me custa nada emiti-la. Tinha-a prometido, ei-la.

1. Este tipo de iniciativas permite pôr em causa, muito legitimamente, o distanciamento crítico dos jornalistas face ao seleccionador. Nem eu nem ninguém no universo dos consumidores de informações quer isto, suponho. Os jornalistas não fazem parte da selecção. Estão de fora e é aí que devem estar. A credibilidade do trabalho jornalístico passa também por cuidar da aparência dessa credibilidade – e não só do seu conteúdo. A história da mulher de César também se nos aplica.

2. Serei eu pela manutenção de uma relação de hostilidade permanente entre os jornalistas e os seus interlocutores? Não sou. Acho até contraproducente, na maior parte dos casos. Mas entre isto (a hostilidade) e o que se passou (a aparência de um excesso de companheirismo) há um ponto de equilíbrio, que me parece ter sido ultrapassado.

3. Por mais difícil que seja, os jornalistas não têm de se associar ao fervor nacional que rodeia a selecção. Retratam esse fervor – não fazem parte dele, pelo menos enquanto desempenham funções profissionais de cobertura das actividades da selecção (o que era o caso). Admito que seja mais confortável ir com a maré. Que até dê mais audiências. Mas isso já está para lá do jornalismo. Já só é “infotainment”. É nisso que se transformaram os relatos de rádio, por exemplo (o que não é de hoje, muito pelo contrário). Mas convém que o exemplo não se alastre aos outros “media”. Chegado aqui, deixem-me perguntar: teria a oferta sido feita se Scolari tivesse na mó de baixo? Resposta: Sei apenas que não foi.

4. Um gesto destes tem outro problema: uma manobra de grupo desta dimensão torna os jornalistas menos independentes não só em relação ao visado (Scolari) como, sobretudo, em relação uns aos outros. Ou seja, dilui a concorrência “inter pares”, que é uma das melhores garantias da qualidade do jornalismo. Além do mais, coloca na posição de ostracizados (maus da fita, ovelhas negras, o que se queira) os que decidiram, com todo a legitimidade, não alinhar. É injusto.

5. Enfim, numa palavra: não havia necessidade.
|| JPH, 16:00

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