O "El Pais", o melhor jornal europeu, dedica hoje umas quantas páginas a Portugal no suplemento Domingo, com direito a editorial e tudo! E a imagem que passa é tudo menos boa. Pode resumir-se assim o artigo de Margarida Pinto: adeus às ilusões portuguesas. Surpresa? Nã… Se fosse possível o país olhar-se ao espelho, tudo o que veria era esse lado cinzento, sombrio e triste. Dava letra para um fado e tudo!
O cenário de fundo do artigo do "El Pais" é o verão quente dos incêndios e o título da peça é “As ilusões devastadas de Portugal”, ilustrada com a fotografia de uma mulher em lágrimas durante um incêndio na aldeia de Outeiro, distrito de Viseu.
É o retrato de um país devastado. O desespero causado pelos fogos é uma metáfora do estado do país e da falta de respostas para outros problemas – o desemprego nos 7%, as famílias endividadas, a desertificação, a falta de alternativas no Litoral, onde vive 80% da população, os 27 mil incêndios deste ano, o fantasma do défice, o aperto do cinto decretado por um primeiro-ministro que prometeu não aumentar impostos e afinal fez o mesmo que criticou ao anterior inquilino de S. Bento... e aumentou os impostos! Uma lista de mazelas
à la carte!
O pessimismo não é invenção dos partidos de oposição: do PS no passado, agora do PSD - PCP e Bloco de Esquerda, longe do círculo de poder, “vivem” desse mercado nacional do pessimismo (e da desilusão) há muitos anos.
De José Gil, filósofo do momento e autor de “Portugal, o medo de existir”, o "El Pais" cita uma longa frase. A todos os títulos exemplar: “Os fogos adquiriram um valor simbólico de tudo o que está a acontecer em vários âmbitos, como se devastação alcançasse distintos níveis. (…) Essencialmente, instalou-se a sensação de que a terra é devastada por culpa nossa, pela nossa negligência e incompetência. E a fatalidade associada aos incêndios acabou por contagiar o pessimismo sobre o futuro da nossa economia. É uma tragédia nacional por culpa dos portugueses e de todos os Governos. Afinal, duvidamos se teremos a capacidade de dar a volta a isto”.
Há um ano, Margarida Pinto fizera uma reportagem, em vésperas das eleições legislativas e que já era um retrato muito a preto e branco da alma lusitana, muito citado nos jornais e rádios. Pessoalmente, achei muito certeiro esse esquisso feito pela jornalista.
No trabalho do jornal espanhol, António Costa Pinto é o optimista de serviço. O sociólogo afirma que o país mudou muito em 30 anos, após a queda da ditadura fascista de Salazar e Caetano – o paós modernizou-se, entrou para a então CEE, aderiu ao euro, baixou a taxa de analfabetismo. “Não há motivos para pensar que o país se esgotou e não tem saída”, diz. Certo. O problema também se mede nas expectativas. Bastar ler os índices de expectativa e de confiança dos empresários e esses andam pelas ruas da amargura. Independentemente de alguns índices económicos até serem menos negros, segundo os analistas. Mas não pega. Governar também é gerir expectativas, além das taxas e dos índices económicos, e nisso, que também é política, José Sócrates tem falhado tanto como os outros.
E falha ainda nos detalhes, no simbólico, o simbólico que vale mais do que dez despachos e cinco entrevistas. O acto simbólico de não resistir à tentação de dar cobertura à nomeação de Armando Vara para a Caixa Geral de Depósitos ou de Fernando Gomes para a GALP.
Não há Expo 98 nem Euro 2004 que nos valha. Resta o fado!
Post Scriptum: Vejo agora no noticiário da SIC-Notícias que “não há incêndios activos em Portugal”.