Após as autárquicas de 2001 - as do "pântano" e da demissão de Guterres - abriram-se no PS vários processos tendo em vista a expulsão de militantes que tinham concorrido como independentes contra candidaturas oficiais do partido. De memória lembro-me dos casos da Mealhada e de Penamacor. Não sei como ficaram esses processos - mas parece-me que cairam porque os visados deixaram o partido. Mas o que interessa é o princípio que orientou a abertura dos processos: nenhum militante do PS pode fazer concorrência ao próprio partido.
Irá a direcção do PS seguir este caminho, face a Alegre? A ver vamos, depende de muita coisa, a começar pelos resultados de domingo. Se o fizer, Alegre tem em sua defesa um argumento de peso: o princípio de que falei aplica-se no caso de candidaturas do partido, oficiais, aquelas em que aparece o símbolo do partido no boletim de voto. Nas presidenciais não é o caso.
Mas há ainda nos estatutos do PS outro ponto por onde poderão pegar, se quiserem resolver o problema "à PCP": aquele que determina como "deveres dos militantes" os de "respeitar, cumprir e fazer cumprir os presentes Estatutos e seus regulamentos, bem como as decisões dos órgãos do Partido". Manifestamente, Alegre - que só avançou depois de o PS "decretar" o apoio a Soares - não está nem a "cumprir" e muito menos a "fazer cumprir" as "decisões dos órgãos do partido".
Há ainda um outro caminho punitivo que o PS poderá tentar contra Alegre: retirar-lhe a vice-presidência do Parlamento. Mas, aqui sim, o jogo é de altíssimo risco. É certo que, com a sua candidatura, o candidato-poeta desbaratou muitos apoios que tinha no seu grupo parlamentar. Mas poderá voltar a reconquistar alguns se a direcção do partido o quiser transformar em vítima. Neste cenário, dificilmente Alberto Martins se manterá na liderança do grupo parlamentar. E outros amigos de Alegre - Maria de Belém, Manuel Maria Carrilho - poderão ser tentados a entrar em choque frontal com a linha oficial do partido.
Chegado aqui recordo que a maioria absoluta do PS se faz apenas por seis deputados. Só Alegre e a sua irmã (também deputada) são (menos) dois. Uma maioria pendurada por quatro deputados dificilmente se poderá chamar de absoluta. O "fenómeno" Alegre tem condições para transformar o primeiro mandato de Cavaco muito mais "interessante" do que à partida se pensaria. O pântano, o pântano...