De todas as prendinhas que
pedi, recebi uma única: o
Bilhete de Identidade, de Maria Filomena Mónica (MFM). Aliás, por pouco não recebi dois exemplares. Breves notas:
1. Lê-se bem (isto é, depressa).
2. A autora tem um problema - grave - com as vírgulas. Nunca tinha visto tanta vírgula tão mal usada. Um verdadeiro holocausto virgulino.
3. Os
spice details cumpriram as expectativas. Não duvido do interesse histórico de se saber que em Oxford subia ao andar de cima para namorar com um colega israelita vestida apenas com um casaco tigreza. Espero ansiosamente o próximo volume da autobiografia. Eu e a respectiva editora, claro.
4. Fiquei sem saber - defeito meu, de certeza - de que forma em concreto é que a sua família, e a mãe em particular, objectaram à sua emancipação académica/profissional. Por outras palavras: onde esteve afinal a rebeldia?
5. Enfim: trata-se apenas de um livro de alguém que se leva demasiado a sério.
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Também recebi (eu e mais 500 000) o "Bilhete de Identidade" neste Natal.
Tendo eu uma atracção inegável e pouco edificante por fait-divers, abri o livro com expectativa. Não esperava uma prosa literária de qualidade elevada, mas uns bons momentos de distracção. Cumpriram-se as curtas expectativas: a qualidade da escrita não é digna de registo e os factos prenderam-me - não os fait-divers amorosos, mas sobretudo o relato da sociedade da época, sobretudo da vida da mãe.
Mas quando acabei de ler o livro surgiu-me mais ou menos a mesma questão: onde está, afinal,a rebeldia?
E pensei na história da minha mãe que hoje tem 61 anos. A minha mãe nasceu e cresceu em Grândola, primeira de 3 filhos de um casal classe média. Sendo na altura Portugal um país salazarento e conservador, o facto de a minha mãe viver em Grândola espartilhava ainda mais as opções de vida. Mas a minha mãe estudou, tirou um curso superior, tirou a carta de condução com 20 e poucos anos, optou pelo afastamento da religião, interessou-se por política, e sobretudo nunca me vendeu a história da sua vida como sendo um feito absolutamente extraordinário. Está bem que não teve toda aquela aquela diversidade amorosa nem rumou a Oxford ou algo que o valha, mas seja como for nunca se sentiu como uma classe à parte ou uma elite.
Não sei se a culpa é o do marketing feito à volta do livro, mas a verdade é que este vale muito mais pelos factos históricos nele narrados do que propriamente pela vida da autora. Sem querer tirar o mérito, claro, a nenhum dos factos vividos.
Atenciosamente,Inês SobralPS. Também registei esse excesso doentio de vírgulas; tantas, tantas, mas tantas, que quase as soletrava mentalmente na leitura, como nos ditados da primária; a coisa acalma à medida que se avança na leitura, vá-se lá saber porquê.