a blogosfera é realmente um sítio muito curioso -- como o mundo. notei ultimamente (graças ao google e ao technorati e às pesquisas egocêntricas que permitem) a existência de uma série de blogues que se intitulam cristãos e dizem bater-se pelos valores que isso implica.
a primeira nota relevante é a sanha (ou senha) persecutória que a maioria desses blogues evidenciam em relação a tudo e todos que não se conformem com a sua peculiar visão. a segunda é a forma como, mesmo quando querem dar ares de tolerância, mais não fazem que sublinhar o seu ímpeto de exclusão.
dei por exemplo com um texto absolutamente imperdível sobre a série the l word, que passa todos os dias na 2: às oo.30. para começar, o senhor em causa diz que não viu 'as cenas chocantes' de que lhe tinham falado, mas mesmo assim acha muito mal que aquilo passe em sinal aberto (conselho: dê uma voltinha nas novelas portuguesas, sobretudo naquelas para adolescentes, e depois conversamos -- pensando bem, converse antes com outra pessoa) porque: 'as lésbicas são todas giríssimas'; 'a série é limitada no drama humano'; 'aquilo pode levar uma mulher -- sobretudo, diz ele, as mais jovens -- a ficar lésbica'.
lá pelo meio destas reflexões que lhe foram suscitadas pela visão de um único episódio da série, questiona, pungente: 'quem é que no seu perfeito juízo, gostaria que as suas amigas, mulher, filhas, mãe e avó, fossem lésbicas?'
eu até o percebo: realmente assim de repente descobrir que a avó e a mãe -- para não falar da mulher -- eram lésbicas pode ser um xuto na tola. sobretudo porque, sendo as coisas como são, o mais certo é que as ditas senhoras tenham passado a vida a esconder o tal facto (isto partindo do princípio de que há pessoas 'lésbicas', que é sempre duvidoso -- mas enfim, isso já é uma conversa demasiado complicada para esta posta).
mas também o incomoda que as amigas gostem de mulheres? e que as mulheres que fazem de 'lésbicas' na série sejam todas 'gisíssimas' (ao contrário das mulheres que nas séries fazem de 'hetero', que são todas medonhas, como se sabe)?
esta é boa. queria o quê, uma série povoada de gordas com bigode e cabelo rapado (que deve ser como imagina as suas lésbicas -- onde é que esta gente tem andado)?
o melhor, porém, é decididamente essa ideia de que ver uma série daquelas pode levar alguém a dar o 'mau passo'. aconselha-se a este sr -- e a todos e todas que pensam (?) como ele -- a ler uns relatórios sobre sexualidade (ou mesmo o diário de anne frank). chegarão à conclusão de que não é despiciendo o número de jovens do sexo feminino que têm experiências sexuais com amigas -- o que certamente fará delas umas perdidas na acepção tão tolerante destas pessoas mas, lamento informar, não as transformou em lésbicas empedernidas.
quanto à questão de fundo -- porquê admitir a exibição de uma série 'destas' em sinal aberto e numa tv estatal, a resposta deveria ser evidente: porque até existirem séries como esta a programação de sinal aberto dava uma imagem do mundo aos tais 'mais novos em período de descoberta da sua sexualidade' que apresentava o relacionamento heterossexual como o único figurável. para o caso de estes cristãos nunca terem pensado nisso, esse facto era (e é) mais uma fonte de sofrimento para aqueles estão a descobrir ou já descobriram outro tipo de relacionamento.
mas enfim: que me terá dado para pregar aos peixes? deve DE ser do excesso de uv na moleirinha.