este blogue começa a parecer ter uma obsessão com o paulo gorjão e as suas constantes indignações com as alegadas aleivosias jornalísticas? começa.
mas de facto, por mais que se queira encarar com bonomia a ombudsmania do paulo, de vez em quando temos de também prover aos leitores da blogosfera e fazer a crítica do criticador.
diz o paulo que andou a ler o acórdão do tribunal de torres novas e descobriu coisas que os media não disseram. nomeadamente, que o pai biológico da esmeralda assumiu a paternidade da criança quando ela tinha menos de um ano de idade. o paulo indica até os parágrafos onde esta informação virá referida.
pois bem, paulo. em primeiro lugar, a informação quanto ao momento da assunção da paternidade veio nos jornais -- no dn, pelo menos, veio certamente, porque eu a escrevi. se precisar, arranjo fotocópias. o que não veio de certeza foi o que o paulo escreveu, já que é falso. aliás, há-de explicar-me onde leu isso na sentença, já que o que lá vem é que baltazar nunes perfilhou a criança em fevereiro de 2003 -- ou seja, quando ela fez um ano. não sei se quando se refere ao assumir está a falar do facto de em julho de 2002, quando inquirido pelo ministério público no âmbito da acção de averiguação de paternidade, baltazar ter afirmado que perfilharia a bebé caso se provasse ser sua filha. é que se é disso que fala, tem uma noção de assunção um pouco diferente da minha.
depois, o paulo, que eu tinha (até julgava que não fazia mais nada) como um atento leitor de jornais, também descobriu agora, na sentença, que a acção de regulação da paternidade foi decidida em julho de 2004 a favor do pai biológico. ainda mais extraordinário. não leu isso em lado nenhum, paulo? não ouviu isso na tv? tem andado a ler jornais e a ver tv do burundi, decerto.
a história está muito mal contada na comunicação social, repete (e repete, repete, repete) o paulo. e dá um exemplo: a entrevista da mãe biológica a uma tv. é interessante. o paulo acha que a versão da mãe biológica não bate certo com o que foi dado como provado no tribunal, ou seja, com o que aqueles juízes consideraram ser a verdade, logo, a mãe biológica contou mal a história e os media deixaram-na contá-la mal. curioso. muito curioso mesmo, tendo em conta que, ao ler o acórdão, duas coisas ficam claras:que a mãe biológica não foi tida nem havida no processo crime e que muito do que é dado como provado assenta exclusivamente na versão do pai biológico e da respectiva mulher.
talvez paulo gorjão, sempre tão cioso dos mecanismos de produção de sentido dos media, devesse debruçar-se sobre os mesmos mecanismos nos tribunais. tem aí pano para mangas, meu caro.
pano para mangas também, mas de outro teor, está nesta singela afirmação do paulo: 'a criança deveria ter sido entregue quando ainda nem dois anos e meio tinha'. nem dois anos e meio, paulo? e onde esteve ela durante esses dois anos e meio? que teria sido dela durante esses dois anos e meio se dependesse dos sentimentos do pai biológico?
para o paulo, parece, as extraordinárias passagens do acórdão em que se dá como normal e aceitável e talvez mesmo justo e certo que um homem, tendo tido sexo com uma mulher sem cuidar de tomar precauções para não a engravidar, recuse ter seja o que for a ver com uma gravidez e uma criança que aquela garante ser de sua (dele) responsabilidade até que essa responsabilidade lhe seja provada com testes de adn são do mais objectivo que se arranja.
é normal e aceitável e talvez mesmo justo e certo que não tenha querido saber, até que os testes de adn, efectuados por iniciativa judicial e não dele (por 1500 euros, paulo, como pode ler no dn -- leu? --, essa informação teria estado disponível em duas semanas), lhe dizerem que foi dele o espermatozóide que fecundou aquele óvulo, se a criança vivia ou morria?
e que de súbito, vendo num papel a certificação do adn comum com a criança, passe a viver 'um sonho' que, como se lê na sentença, se 'desmorona' porque não lhe entregam a criança?
leia-se a sentença:
'50- O Demandante quis e quer, desde que o soube ser, assumir-se realmente como o pai da menor Esmeralda, ainda hoje espera adormece?-la, acorda?-la, leva?-la a? escola, alimenta?-la, trata?-la na doenc?a, passea?-la, brincar com ela, apresenta?-la aos tios, primos e avo?s, dar-lhe a conhecer a sua realidade, inseri-la no seu agregado familiar composto por si, a sua companheira ja? de ha? alguns anos e o filho menor desta, a quem trata por o meu pequenito.
51- Gosta muito de crianc?as
52-Tem construi?do a sua vida familiar perspectivando englobar nela a sua filha Esmeralda, mudou de casa para recebe?-la, mobilou e decorou um quarto so? para ela.
53- A sua frustrac?a?o e sentimentos de impote?ncia, foram-se acentuando ao longo dos meses, transmudando-se em tristeza, angustia e desespero, ao ver-se sucessivamente impedido de ter acesso a? respectiva, filha tudo mais agravado com as sucessivas reviravoltas na actuac?a?o do arguido e esposa.
54- Sentimentos, mais agravados e acentuados apo?s a regulac?a?o do poder paternal, quando constatou que o mandado de entrega da menor remetido a? P.S.P., do Entroncamento, na?o era cumprido, apesar de ter deslocado va?rias vezes ao posto daquelas Forc?as de Seguranc?a, na esperanc?a de obter noticias animadoras, embora sempre em va?o.
55-Sente-se impotente, desesperado, desacreditado, humilhado, rebaixado e atentado nos seus direitos, de protecc?a?o da vida familiar, face a? inefica?cia e inviabilizac?a?o na concretizac?a?o de uma decisa?o que estipula que a sua filha deveria estar junto dele e na?o esta?, causada pelo modo de agir do arguido e esposa, ao afastarem e ocultarem a menor, como bem entendem e para onde querem, recusando e impedindo a sua entrega, bem sabendo estar obrigados a entrega?-la.
56- Em conseque?ncia o Demandante passou a ser uma pessoa reservada e fechada sobre si mesmo, evita falar na sua filha e em toda a situac?a?o a? sua volta, porque sofre ao ver-se privado, como era seu direito, de acompanhar o processo de crescimento e desenvolvimento da sua filha.
57-Sonha com a menor, imagina a sua voz, os seus gestos, frequentemente chora e pede a? companheira para o ajudar por na?o aguentar mais a espera em ter consigo a menor.'
que diria o paulo se este romance lhe fosse contado por um jornal ou uma tv? perguntaria qual a fonte, não era, paulo? perguntaria como se chegou a estas conclusões, não era, paulo? pois era. perguntaria, por exemplo, quem é 'a pessoa reservada e fechada sobre si mesma que evita falar da filha e em toda a situação à sua volta' que desde 2004 anda a dar entrevistas a tudo quanto é jornal e tv sobre, precisamente, 'a filha e toda a situação à sua volta'.perguntaria, por exemplo, que seria da criança se não houvesse testes de adn.
não quero dizer com isto, paulo, que não tem razão quando diz que 'há muito mais para saber'. claro que há. claro que há uma tendência maniqueísta no discurso mediático. e claro que é preciso ter cuidado com abaixos-assinados e com comboios de opinião. mas é preciso também, paulo, ter cuidado com essa ânsia de apontar o dedo e de 'contrariar' aquilo que acha ser o sentido dominante do discurso. é que às vezes faz figuras um pouco ridículas. que são escusadas, acho eu.